Autoconhecimento por meio do horror
- Jéssyka Prata
- 20 de nov. de 2015
- 3 min de leitura
Era um fim de tarde ensolarado de primavera. O tempo estava quente e eu não sabia qual roupa vestir. Precisava impressionar. Foi então quando eu vi, no fundo do armário, o acessório perfeito para aquela noite de sexta-feira 13: um chapéu de bruxo que ganhei de um wicca¹ quando decidi conhecer mais sobre o misticismo, embora não tenha percorrido muitos passos por esse universo. Por quê? Por medo.
O evento, escolhido a dedo para que eu perdesse de uma vez por todas o medo que me dominava, era uma maratona de curtas de terror. Eu, apaixonado pela sétima arte, entendi que não poderia deixar a oportunidade passar. Ao chegar ao local, percebi que era o único a caráter, e isso me fez querer voltar — tanto tempo perdido à toa.
No chão, logo na entrada, havia marcas de pisadas de sangue. Elas levavam até uma antessala onde eram vendidos chocolates em forma de crânio. Ao fundo, imagens de clássicos do horror eram projetadas ao som de The Well, de Hans Zimmer.
Um pouco desconcertado, fui para um canto do salão e comecei a observar o público que chegava, a maioria vestida de preto, com maquiagens pesadas e sem vontade de conversar. Após um tempo, tomei coragem: eu entrei na sala de exibições — com um olho aberto e o outro fechado.
Caveiras penduradas pelas paredes, baratas no chão, pouca iluminação e sons de gritos compunham a cena. Comecei a me perguntar o motivo pelo qual eu tinha ido, mas meu inconsciente respondia: João, é só filme de terror. Você gosta de cinema. E cinema é cinema, independente do gênero. Abri bem os olhos e escolhi a última poltrona.
Ao me acomodar, as luzes se apagaram. O silêncio reinava, apesar da sala cheia. Com mãos geladas e coração disparado, o medo pelo o que estava por vir me dominava. Até que uma voz, vinda do canto direito da sala, dizia que a sessão teria duração de 1h15 e que as produções abordariam, em meio ao horror, a religião. Em seguida, a tela se acendeu e meus olhos se fecharam instantaneamente. Eu sabia que queria assistir, mas tinha receio do que ia ver.
No primeiro curta, são abordadas as brincadeiras para invocar espíritos. A produção, rápida e tranquila², faz com que eu me sinta seguro e, então, fixo os olhos na tela: isso é terror? Moleza! Essa sensação dura até os primeiros minutos do segundo filme. O protagonista mata a mãe a pedido da namorada³. Cenas de facadas — náusea, muita náusea. No terceiro, o canibalismo é retratado de maneira cômica e religiosa⁴.
Algumas pessoas então começam a deixar o local, outras, tampam os olhos — eu não era o único. O filme seguinte mostra uma mãe que maltrata o filho já adulto. Ele, perturbado, começa a ter alucinações, mata a mãe e a namorada, que era prostituta e estava grávida. No fim, ele aparece sentado à mesa com as duas mortas ao lado e na panela, o feto⁵.
A temperatura lá fora começa a cair e eu olho ao redor incessantemente a fim de encontrar algo com o que eu pudesse me distrair. Já pensava na noite de insônia que eu iria ter. As exibições continuam.
O quinto curta aborda a história de um policial que mata um inocente⁶. O espírito do menino o persegue. Ele enlouquece. No sexto e último filme, os espíritos também dominam a cena.
Quando a tela fica novamente escura, ouço a voz: Horror é isso! Na minha cabeça já era hora de sair dali e esquecer de uma vez por todas aquelas imagens, deletar o momento e, quem sabe, doar aquele chapéu. A voz me convence a ficar.
As luzes voltam a se acender, e um jovem, no canto direito da sala, ganha forma.
Fala sobre o terror e o que havíamos assistido. Explica, com olhar ainda de estudante, de onde vinha o horror daquelas cenas. Em seguida, dá a palavra à plateia, já aflita para participar. Nesse momento, eu percebo que todo o medo que acumulei durante aquelas exibições, ou, talvez, durante toda a vida, se resumia a um olhar pouco experiente diante das produções.
Saio de lá já tarde, por volta das 23h. Desço caminhando, sozinho, por um morro escuro, pensando que havia conseguido cumprir o propósito daquela noite de sexta-feira 13. Soube que, desta vez, o medo não era meu companheiro.

¹ Wicca é uma religião pagã que se dedica ao conhecimento da espiritualidade a partir da natureza e da psique humana.
² Breu, de Paulo Moraes, 2015.
³ Amor Só de Mãe, de Dennison Ramalho, 2002.
⁴ Presépio Maldito, Rodrigo Mangal e Bernardo Falcão, 2015.
⁵ Cabrito, de Luciano de Azevedo, 2015.
⁶ Ninjas, de Dennilson Ramalho, 2009.
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