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Olhares repressivos, amores oprimidos

  • Alessandra Crispim
  • 30 de jun. de 2016
  • 3 min de leitura

Foto: Ilustrativa

O cantor e compositor Lulu Santos, em uma de suas letras mais famosas, teceu as seguintes frases: “E a gente vai à luta e conhece a dor. Consideramos justa toda a forma de amor.” Infelizmente, nem todas as formas de amor são respeitadas. O coração e a memória de muitas pessoas carregam histórias desagradáveis de discriminação social que sofreram por demonstrarem carinho em público.

O biólogo Glauber Barino, 34, passou por um constrangimento desse tipo. Ele estava no condomínio de seu irmão, junto com seu namorado, quando o porteiro anunciou que os moradores estavam incomodados com a presença dos dois nas dependências da piscina: “ Estávamos apenas próximos, nem sequer fizemos carinhos. Na piscina existiam outras pessoas que nos observavam com preconceito”. Na época, Glauber ainda não havia assumido a sua homossexualidade. “A partir desse dia vi que minha família tinha que saber o que estava acontecendo, bem como eu não poderia ficar calado perante essas coisas. A mentalidade vai mudando quando vemos que não éramos nós que estávamos errados”.

Jhordan e Bombom Lessa. Foto: Arquivo Pessoal

E quando os olhares de repreensão acontecem dentro da sua rede de amizades, em um espaço denominado “seu”? O casal Jhordan Lessa, 49, e Bombom Lessa, 42, relembrou momentos em que a própria rede de amigos discriminava a forma dos dois de se relacionar em público. Jhordan é um homem trans e, na época, estava iniciando a transição. “ Todo mundo acha que a discriminação, o preconceito, vem só da sociedade que está de fora do mundinho LGBT, mas o que a gente sofreu foi dentro do nosso círculo”, revela. O casal conta que as amigas implicavam até com os olhares que eles trocavam. Bombom comenta que o fato de chamar Jhordan de marido, mesmo quando ainda era visto socialmente como lésbica, causava indignação nas amigas. Na época, o casal passou a policiar suas carícias e demonstrações de afeto entre os amigos: “ Eu recuei junto com o Jhordan porque sabia que ele estava chateado. Era complicado porque era um grupo muito grande, a maioria lésbicas, vários casais, e todos dançavam pulavam, aproveitavam a noite e a gente não podia demonstrar muita coisa”. Do passado ficaram apenas as risadas e o desejo de Jhordan para que o mundo seja mais feliz. “ Quando estamos de bem com a vida, não temos tempo para encher o saco de ninguém”, conclui sorrindo.

Gabriel Presto Foto: Arquivo Pessoal

“Num mundo onde se amar e amar o próximo é errado, qualquer forma de demonstrar o contrário é revolucionária”. O estudante de Letras da UFJF Gabriel Presto, 18, sabe bem do que está falando. Ele se apresenta como não binário, não se vê representado em nenhum dos esteriótipos de gênero presentes nos discursos dominantes. Mesmo jovem, o estudante traz em suas lembranças as marcas da intolerância. Sob xingamentos de “viados”, "tem que matar", "vamos matar todos" e "é menino ou menina?", Gabriel e um amigo foram abordados por um grupo de rapazes, dentro de um carro, em frente a um supermercado 24h na região do bairro Alto dos Passos. Mesmo após o episódio, o estudante não se intimidou: “Ultimamente, apesar de saber e conhecer os riscos, vejo o afeto como algo revolucionário, então faço questão de demonstrá-lo em público com qualquer pessoa que eu esteja e , ‘felizmente’, até o momento só tenho reparado olhares estranhos e incomodados”.

Jéssica Laina Foto: Arquivo Pessoal

A discriminação social por gênero ou por orientação sexual ganha maior gravidade com as vítimas femininas. A ameaça de violência sexual está sempre presente nos discursos homofóbicos contra a mulher homossexual. Jéssica Laina, 24, estudante de odontologia, já passou por duas situações que marcaram a sua vida. Aos 16 anos, ainda com dúvidas sobre a sua sexualidade, foi abordada por um segurança de um shopping central de Juiz de Fora. O funcionário a alertou sobre um comportamento inadequado e ameaçou expulsá-las do local. Na ocasião, ela estava com mais duas amigas sentadas na praça de alimentação e sua perna estava por cima da coxa de uma delas. Alguns anos depois, acompanhada de sua namorada, Jéssica foi abordada por um homem: “Ele disse que nos daria o que faltava e nos mostraria o que era ser homem de verdade. Minha namorada se exaltou e revidou o xingamento. Ele disse que iria estacionar e iria nos bater pra valer. Mesmo depois disso tudo, eu decidi não me calar. Conversei com a minha família e mesmo com as limitações de cada um, nos damos bem. Das pessoas que optam por não conhecer a diferença do outro, dessas eu tenho pena”, desabafa Jéssica.

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