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Yohan e Maria Antônia: uma história de amor (ao próximo)

  • Isabel Senna
  • 19 de jul. de 2016
  • 3 min de leitura

Todos dias ouvimos sobre histórias de amor. Reais, ficcionais, possíveis ou impossíveis. Mas quantas vezes temos contato com histórias de respeito e amor ao próximo? Há algumas semanas tive a oportunidade de conhecer Yohan de Arc Lima e Maria Antônia de Paula Rosa, um casal de pastores que, em sua igreja, fala do amor acima de qualquer diferença. Durante uma hora e meia, que não senti passar, os ouvi falar sobre o amor em todos os seus aspectos. Mas para entender o presente, precisamos voltar um pouco no tempo.

Há 59 anos, na pequena cidade de Porciúncula, nascia Joana. Criada como uma criança do sexo feminino, Joana viu, aos 10 anos, mudanças que a diferenciavam de outras meninas da sua idade começarem a aflorar em seu corpo. Junto a família, procurou o médico que fez seu parto para entender o que estava acontecendo e descobriu que, na verdade, ela era intersexo. Isso significa que Joana tinha características fisiológicas dos dois sexos.

O conselho do médico na época foi de pouca ajuda: não havia o que fazer naquele momento em relação à parte biológica e a questão do gênero deveria ser decidida pela própria Joana quando crescesse. Outros pontos, porém, sofreram interferências imediatas. Para protegê-la de perseguições e bullying, a família a tirou da escola e seus estudos passaram a acontecer dentro de casa.

Aos 12 anos, Joana conheceu a religião evangélica. Anteriormente, foi católica e quase teve como destino o convento, mas conheceu o conforto nos livros e nos cultos realizados próximos a sua casa. O menor versículo da Bíblia, “Deus é amor”, apresentou uma nova perspectiva para ela. A partir dali, passou a ver que, independente das diferenças de cada um, Deus amava todos igualmente.

Mas suas lutas não pararam por aí. Aprendeu a costurar, bordar e trabalhar com artesanatos. Porém, o autoconhecimento, que era o que mais lhe interessava, ainda não havia descoberto. Nas tentativas de tentar entender quem era e o que ser intersexo significava, Joana cresceu e conheceu, em uma igreja da cidade de Itaperuna, por volta de 1987, a pessoa que ajudaria a mudar sua trajetória.

Foram 10 anos convivendo e guardando sentimentos por Maria Antônia. Era recíproco e a coragem demorou a chegar para as duas falarem abertamente sobre o que sentiam. Em 1997, decidiram ficar juntas independentemente de qualquer coisa e se casaram em maio de 2015. Naquele momento, não tiveram a oportunidade de continuar na igreja que faziam parte e, com o apoio de amigos e familiares, fundaram a Missão Macedônia (Mima).

Com base na religião evangélica, passaram a receber na igreja todas as pessoas que queriam buscar o apoio da fé e a iniciativa se expandiu em outras cidades mineiras. Não importava para eles a particularidade de cada um ou suas escolhas. O que importava era que todos os que ali chegassem deveriam respeitar uns aos outros, sem questionar ou julgar suas atitudes.

Quebrada uma barreira, faltava ainda uma outra. Mais uma vez o autoconhecimento batia à porta de Joana, pedindo um pouco de atenção. Buscou hospitais em diversas cidades, fez exames, mas não obteve respostas. Foi então que, há três anos, em uma pesquisa da internet encontrou o apoio que precisava no Centro de Referências em Direitos Humanos de Juiz de Fora. Ali, ela descobriu que poderia decidir com qual gênero se identificava, mudar de nome e fazer a cirurgia que precisava. Joana havia se libertado e, naquele momento, nasceu Yohan.

O Movimento LGBTTI também foi essencial para que essa mudança acontecesse, abrindo caminhos para que ele conhecesse histórias diferentes de pessoas que também lutavam pela liberdade. A família, os amigos e os frequentadores da Mima mostraram total apoio naquele momento, sem questionar sua escolha. Da mesma forma que Yohan e Maria Antônia abriram os corações para ajudar outras pessoas, viram as pessoas próximas demonstrarem amor a eles naquele momento.

Por questões burocráticas, Yohan ainda não conseguiu mudar o nome oficialmente nem marcar a cirurgia. Mas faz questão de contar sua história para aqueles que quiserem conhecer, procurando também ajudar todos aqueles que vivem situações parecidas com a sua. Juntos, ele e Maria Antônia transmitem a mensagem de amor ao próximo tanto dentro quanto fora da igreja.

“Você amar uma pessoa que está dentro do seu caixote ou do caixote que a sociedade impôs, isso não é amor, é conveniência”, afirma Yohan. A mensagem ficou clara para mim e saí de lá com muito para refletir. Durante uma hora e meia eu recebi muito mais que uma entrevista. Recebi aprendizado, conhecimento e novas perspectivas sobre o significado da palavra amor e o quanto ela pode alcançar em um mundo que, infelizmente, ainda é cheio de intolerância.

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